Sumários

T.7. Futuro Estado de Bem-Estar

12 Maio 2025, 18:00 Maria Asensio Menchero


O Capítulo 51 do The Oxford Handbook of the Welfare State (2022), intitulado "From Welfare States to Planetary Well-Being", de autoria de Ian Gough, aborda a urgência de reconfigurar os estados de bem-estar social à luz da crise climática global. O autor argumenta que a emergência ecológica, em particular o colapso climático, representa um desafio existencial que ameaça profundamente as bases das sociedades contemporâneas. Esta crise terá implicações significativas tanto para os países do Norte Global como para os do Sul Global, exigindo respostas políticas e sociais profundas. Gough critica o modelo tradicional de estado de bem-estar, que se baseia na lógica do crescimento económico contínuo aliado à redistribuição de riqueza. Para ele, este modelo é inadequado para lidar com os limites planetários. Em seu lugar, propõe a transição para um "Estado de mitigação climática", que incorpore uma nova visão de bem-estar centrada na sustentabilidade e não apenas na prosperidade material.

Entre as transformações sugeridas, destacam-se a necessidade de reduzir o consumo e o tempo de trabalho, gerir ativamente o decrescimento económico (conceito conhecido como “economic decrementalism”), e estabelecer limites mínimos e máximos de rendimento. Estas medidas visam criar uma sociedade mais equitativa e ecologicamente responsável, onde o bem-estar seja desvinculado do crescimento material ilimitado. Apesar de reconhecer a urgência e racionalidade dessas mudanças, o autor expressa ceticismo quanto à viabilidade política de sua implementação. As propostas são vistas como radicais, mas necessárias, e Ian Gough destaca que os desafios atuais colocados pelas alterações climáticas são ainda mais exigentes do que aqueles enfrentados pelo Estado Social no século XX.

Tema 6. Os Direitos Sociais da Cidadania

7 Abril 2025, 20:30 Maria Asensio Menchero


Esta sessão focou-se no capítulo de John D. Stephens (2021) que desenvolve  o conceito de direitos sociais da cidadania proposto por T.H. Marshall, destacando a sua relevância enquanto base normativa e histórica do Estado Social moderno. A análise parte da ideia de que os direitos sociais – ao lado dos direitos civis e políticos – são fundamentais para a plena integração do indivíduo na vida económica e social de uma sociedade democrática. Contudo, o autor sublinha que, apesar da linguagem da cidadania sugerir igualdade, na prática os direitos sociais são frequentemente condicionados, nomeadamente através de contributos anteriores, testes de recursos ou pertença a grupos laborais específicos.

Stephens revisita diferentes abordagens teóricas e metodológicas que procuraram medir e conceptualizar os direitos sociais, argumentando que os simples níveis de despesa pública não são suficientes para captar a "generosidade" real das políticas sociais. O autor analisa indicadores como os desenvolvidos por Esping-Andersen, bem como tentativas mais recentes que incorporam aspectos como cobertura, taxas de substituição, duração dos benefícios e critérios de elegibilidade. Esta análise permite observar como os Estados providenciam proteção social de forma diferenciada, refletindo tanto variações institucionais como preferências políticas.

O capítulo integra também perspetivas críticas, nomeadamente as feministas e pós-marxistas, que apontam para lacunas na abordagem clássica aos direitos sociais. Uma crítica central é dirigida à ideia de "desmercantilização" como sinónimo de cidadania social. Stephens argumenta, apoiando-se em autoras como Gøsta Esping-Andersen e Ann Orloff, que para muitos – especialmente mulheres – o direito ao trabalho pode ser tão ou mais importante do que o direito de sair dele. Deste modo, as políticas de conciliação entre trabalho e vida familiar, bem como os direitos associados ao cuidado, ganham crescente destaque na conceção contemporânea de cidadania social.

Do ponto de vista empírico, Stephens explora a relação entre os direitos sociais e diversos resultados socioeconómicos. Mostra que níveis mais elevados de proteção social tendem a estar associados a menor pobreza, maior igualdade de género e níveis mais altos de participação no mercado de trabalho – especialmente quando incluem benefícios de curto prazo, como licenças parentais, apoios ao desemprego e políticas de emprego ativo. Em contraste, políticas protetoras mais rígidas (como regulação laboral excessiva) podem ter efeitos contraproducentes sobre o emprego.

O autor reconhece, no entanto, que subsistem desafios significativos na medição comparativa dos direitos sociais, bem como na compreensão dos fatores que os moldam. A literatura não é consensual quanto à influência relativa de partidos políticos, estrutura de classes, globalização ou preferências ideológicas na formação das políticas sociais. Assim, Stephens defende a necessidade de aprofundar a investigação sobre como os direitos sociais são concebidos, implementados e evoluem, tendo em conta as especificidades nacionais e as novas pressões transnacionais.

Por fim, o capítulo defende uma visão expandida dos direitos sociais da cidadania que vá além dos esquemas tradicionais de transferências monetárias, incorporando o direito a oportunidades reais de participação económica, social e política. Esta expansão implica considerar o acesso a educação ao longo da vida, políticas de inclusão laboral, serviços de cuidado e medidas para mitigar riscos associados a novas formas de exclusão.

Tema 5. Mercado de trabalho_Globalização, Mudança Tecnológica e Emprego

31 Março 2025, 20:30 Maria Asensio Menchero


Com base no artigo de Chen et al. (2014), "Globalisation and the Future of the Welfare State", este conjunto de aulas propõe uma reflexão crítica sobre a relação entre a globalização e o futuro das políticas sociais nos países desenvolvidos. Ao longo de quatro sessões, os estudantes serão convidados a analisar argumentos teóricos e empíricos, debater hipóteses concorrentes e aplicar conceitos em contextos reais e comparativos.

A primeira parte fundamenta-se nos principais debates sobre o impacto da globalização no Estado Social. A chamada "sabedoria convencional" defende que a crescente integração económica internacional, ao reduzir a margem de manobra dos governos nacionais, conduz inevitavelmente a uma redução das políticas de proteção social, provocando uma "corrida para o fundo" (race to the bottom). Serão exploradas as principais ideias por trás desta perspectiva, nomeadamente os efeitos da mobilidade de capitais, a concorrência fiscal e a perda de autonomia das políticas redistributivas. A aula incluirá ainda uma análise comparativa da evolução da despesa social em países como Suécia, Alemanha, Reino Unido e EUA, com base em dados da OCDE entre 1995 e 2007.
Na segunda parte, foram analisadas as contribuições teóricas que desafiam a visão dominante. Através do modelo desenvolvido por Molana e Montagna (2006), foi introduzido o conceito de economias de escala agregadas e ligações verticais intersectoriais na produção. Este modelo sugere que a abertura internacional pode, na verdade, reforçar a eficácia das políticas sociais, através de um ciclo virtuoso de aumento da procura, especialização produtiva, crescimento da produtividade e expansão do Estado Social. Foram discutidas as implicações desta abordagem para o desenho de políticas públicas e para a compreensão da globalização como uma oportunidade e não apenas como uma ameaça.
A terceira parte, foi dedicada à análise empírica. Foram apresentados os resultados de regressões econométricas que relacionam o crescimento da produtividade (TFP) com os níveis de despesa social e a estrutura produtiva dos países (medida através do índice de “upstreamness”), discutindo o papel das empresas multinacionais e do investimento estrangeiro direto (IED), bem como a hipótese de que elevados níveis de despesa social podem contribuir para a estabilidade económica e atratividade dos países, contrariando os argumentos de que estas políticas prejudicam a competitividade. 

Tema 4. Legitimidade Política e Estado de Bem-Estar

24 Março 2025, 20:30 Maria Asensio Menchero


Os textos analisados (Chung, Taylor‐Gooby and Leruth (2018) procuram explorar a legitimidade política e os desafios enfrentados pelo Estado Social no contexto da União Europeia, com um enfoque particular nas percepções e atitudes dos cidadãos relativamente às políticas sociais. Os autores refletem sobre o papel dos inquéritos no estudo do Estado Social, salientando fatores como as alterações demográficas, a despesa pública e a emancipação feminina. Um dos aspetos em análise é o impacto da Grande Recessão de 2007/2008, caracterizada pela estagnação económica, a austeridade e a polarização política, resultando num menor apoio à União Europeia e num aumento da desconfiança nos governos.

O estudo sublinha a importância das atitudes dos cidadãos para compreender e orientar as reformas políticas. São utilizados métodos quantitativos e qualitativos para captar as perceções, enquanto a modelação estatística relaciona fatores estruturais, como os rendimentos ou a filiação partidária, com a perceção do Estado de bem-estar. A abordagem qualitativa baseia-se em grupos focais, enquanto o modelo teórico "file-drawer" interpreta as atitudes como propriedades estáveis e intrínsecas aos indivíduos.

São identificados desafios como a volatilidade macroeconómica, a digitalização económica e a fragmentação dos vínculos laborais, bem como dilemas associados à migração e à multiculturalidade. As reformas políticas são analisadas em termos de efeitos de recompensa (aumento do apoio ao Estado Social) e de sobrecarga crítica (resistência às políticas consideradas excessivamente dispendiosas). Reflete-se também sobre a influência dos meios de comunicação na formação de atitudes, considerando as percepções distorcidas e a estigmatização dos grupos vulneráveis.

O estudo destaca ainda a necessidade de métodos inovadores para superar as limitações dos inquéritos tradicionais, promovendo a integração de abordagens qualitativas e quantitativas para captar as nuances das atitudes sociais. As atitudes em relação ao Estado Social são vistas como fundamentais para moldar políticas públicas eficazes e assegurar a legitimidade política.

Tema 3. Novos Riscos Sociais e a Transformação do Estado de Bem-Estar na Europa"

17 Março 2025, 20:30 Maria Asensio Menchero


Este tema aborda os principais debates contemporâneos sobre a relação entre o Estado e o mercado, com ênfase nos novos riscos sociais e no chauvinismo assistencialista. A primeira parte, fundamentada no texto de Taylor-Gooby , analisa a evolução do Estado-Providência nas décadas de 1950 e 1970, período caracterizado pelo crescimento económico contínuo, forte solidariedade intergeracional e pleno emprego. No entanto, as transformações socio-demográficas e económicas, como o envelhecimento populacional, a flexibilização do mercado de trabalho e a crescente participação feminina na força de trabalho, deram origem a novos desafios. Essas mudanças impulsionaram o "retrenchement" dos Estados-Providência, levando a privatizações e reformas estruturais.

Os novos riscos sociais diferem dos antigos riscos sociais tanto na perspectiva governamental quanto na dos cidadãos. Para os governos, enquanto os riscos tradicionais demandavam altos investimentos e eram sustentados pela solidariedade coletiva, os novos riscos exigem políticas voltadas à empregabilidade e à sustentabilidade fiscal. Já para os cidadãos, esses riscos atingem sobretudo jovens e grupos minoritários com menor acesso à educação.

A segunda parte, baseada no estudo de Afonso e Negash (2024), investiga o conceito de chauvinismo assistencialista, que pode se manifestar tanto na restrição à entrada de imigrantes quanto na limitação de seu acesso ao Estado-Providência. O estudo examina as preferências individuais sobre inclusão social e abertura à imigração, destacando a influência da educação nas atitudes mais receptivas. A partir de dados do European Social Survey, os autores evidenciam diferenças significativas entre os países europeus: enquanto a Suécia apresenta maior apoio à inclusão dos imigrantes no sistema de bem-estar, a Hungria se destaca pela sua postura predominantemente excludente. Os resultados indicam que indivíduos com maior escolaridade tendem a adotar posições mais abertas à imigração, ao passo que aqueles com menor nível educacional mostram maior propensão a defender as restrições dos imigrantes aos benefícios sociais.

Além disso, o estudo aponta que a dependência dos imigrantes em relação a benefícios sociais pode intensificar as atitudes chauvinistas, embora a relação entre os rendimentos e as preferências políticas não seja conclusiva. Os autores concluem que são necessários mais estudos para aprofundar a compreensão sobre os fatores que influenciam essas atitudes, sugerindo a realização de estudos experimentais para avaliar o impacto das políticas de bem-estar na percepção pública sobre a imigração.